quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O veneno da limitação

Será que deve existir algo pior do que se sentir limitado? Bem, acho que sim. Mas não deve ser tão pior assim... Não poder andar, ver, ouvir, sentir, sorrir, falar, pensar... Existem tantas formas de limitação que fica difícil listar todas ou, no mínimo, a maioria. E o que me surpreende é que o ser humano foi preparado para agir sob qualquer espécie de limitação.
Luta contra a fome, quando existem cerca de 1 bilhão de pobres no mundo; luta contra a violência, que faz somente no Brasil 48 mil vítimas anuais por homicídio (o que representa 1o% dos homícidios no mundo); contra a injustiça, onde tantos crimes permacem sem solução. Cito dois emblemáticos, entre tantos anônimos: o da missionária Doroty Stang e o da jornalista Sandra Gomide; luta pela liberdade de pensar, de agir, de falar, de decidir, de ir e vir, de manifestar-se, de opor-se, de se fazer ouvir; enfim, luta para viver.
Para um sonhador, não existe pedra maior do que a limitação; não só a que ele é responsável, mas também a que é imposta por outras pessoas e/ou circustâncias. Perguntem ao pai da dupla Zezé de Camargo e Luciano se as limitações por vezes não o fizeram pensar em desistir. Ou ao nadador paraolímpico Clodoaldo Silva se as palavras de desestímulo que deve ter ouvido na vida não o fizeram pensar sobre a capacidade dele enquanto atleta. E a quem tem sede de conhecimento, como é o meu caso e de tantas outras pessoas, se os entraves que encontramos no caminho não freiam o desejo de saber mais e mais.
A sorte é que igual a bilhões de pessoas, eu, Francisco, Clodoaldo, lutamos todos os dias para vencer as limitações e as conseguimos vencer. Estou caminhando e isso é o que importa. Quanto aos limites que encontro no caminho, acabo descobrindo formas de pisá-los. Não são intransponíveis! Sou brasileiro e desistir não está no meu dicionário...

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Esse adorável vício de escrever

Havia já esquecido como é prazeroso externar o que pensamos e/ou sentimos através das palavras escritas. Confesso, não lembrava da última vez que tinha parado um pouco na minha rotina para escrever algum texto que estivesse com muita vontade. Ontem senti bem isso. As idéias não paravam de "pipocar" na minha cabeça e chegaram a incomodar meu sono. Por pouco, quase levanto da cama e recomeço a escrever. O retorno a essa paixão antiga se deve a este maravilhoso meio chamado blog e às pessoas que, sem intenção, me apresentaram a ele.
E por que "Aspectos do Cotidiano"? Sempre tive admiração pelas crônicas por elas possuírem sentimentos os mais variados nas entrelinhas. Rubem Braga ("Porque o silêncio não tem substância. Ele é vazio como grande redoma de vidro, e o que vive nele é a última palavra ou o último gesto"), Carlos Heitor Cony (O menino das meias vermelhas), Pedro Bial (Filtro Solar), Clarice Lispector ("É timidamente, é audaciosamente, que ouso falar sobre o mundo"), e por aí vai... As crônicas possuem mais conteúdo porque são carregadas de sentimentos. Fazem refletir. E foi por gostar tanto das crônicas que resolvi criar este blog, para exercitar a ferramenta de trabalho que - espero e confio - vai me acompanhar por toda a vida de jornalista.
Todos os dias paramos para fazer alguma coisa que muitas vezes não acrescenta nada as nossas vidas. Assistimos à televisão, conversamos besteiras, discutimos, dormimos muito, ou... nem isso fazemos. Experimente escrever sobre o que tiver vontade nesse tempo e verás o quanto é prazeroso. E esse prazer vicia, eu que o diga. Boa parte da culpa dedico a Gilmara Dias, companheira de trabalho na Rede Paraíba de Comunicação. Foi lendo os textos que ela escrevia que renasceu em mim a vontade de escrever.
Havia já esquecido o quanto é bom escrever. Que bom, lembrei. A minha inspiração vem de tudo o que me cerca: o cotidiano.

O poder de uma conversa

Considero a conversa uma das maiores fontes de conhecimento - se não a maior. E na conversa, acredito que ouvir seja o mais proveitoso. Enquanto ouvimos, trabalhamos a reflexão, identificamos contradições, aprendemos o que não falar, o que falar, estudamos o solo em que pisamos (metáfora), traçamos o mínimo do perfil de uma pessoa (acerta-se em algumas vezes se a audição for aliada da observação) e muitas vezes não nos leva a lugar nenhum e por aí vai... Mas isso nã0 acontece na maioria delas.
Ultimamente o Jornalismo tem pautado a maioria das minhas conversas. Falei sobre o caso da menina sequestrada e morta pelo ex-namorado, sobre o editorial que William Bonner fez hoje sobre um caso de violência no Rio, onde uma mulher grávida e a filha de quatro anos foram baleadas - a mãe morreu -, sobre mercado de trabalho para a profissão, sobre o tratamento diferenciado que o jornalismo dedica a assuntos diferentes. Já ouvi dizer que temos duas orelhas e apenas uma boca para ouvir mais e falar menos. Até onde isso é verdade, não sei.
Por enquanto, vou conversando na busca de mais aprendizado. Sobre o Jornaismo, continuo a filtrar o que me é dirigido para o bem e evoluo com isso. O chato é que não são todas as pessoas que enxergam nossa evolução - ou não querem enxergar. E, você sabe, no mercado de trabalho, dependemos muito da visão que os outros têm sobre nós e o nosso trabalho. Infelizmente e felizmente é assim.
Conversar me ajuda a formar opinião ou deformar a que já tenho. Normal. Ela serve para isso, para convencer. Conversar, ouvir, me ensina muito, mas por vezes também me confunde.

domingo, 26 de outubro de 2008

Assim é Campina Grande

26 de outubro de 2008. Para trinta cidades do Brasil, hoje é dia de voltar às urnas para decidir de uma vez por todas quem será o "servidor público" que irá administrar a cidade pelos próximos quatro anos. Campina Grande é uma delas. A cidade com mais de 266 mil eleitores está ansiosa para saber o nome do vencedor.
Falar sobre a política em Campina Grande é o mesmo que falar do clássico no futebol entre Treze e Campinense: paixão. Aqui, numa das maiores cidades do interior do nordeste, não esperava encontrar cenas típicas de um interior pequeno. A maioria das casas na cidade demonstram através de bandeiras sobre o teto a preferência política. E não são só as casas... Carros, bicicletas, ruas, postes, animais... Hã?! Pois não é que vi uma vez um cachorro vira-lata enfeitado de vermelho em plena movimentação política no primeiro turno!
Outro dia ainda, vi o esterismo de uma mulher dentro do ônibus que provocava os adversários pela janela e o revide de quem se sentia ofendido. Campina é assim... extrema. A vontade de competir parece estar nas veias da população. Compete com João Pessoa (capital) para ser a cidade mais importante do Estado; compete dentro da cidade para ver qual o melhor time de futebol; compete para levar ao poder uma das duas cores que representam as coligações. E a competição é fervorosa! Mas, como tudo na vida, tem suas contradições e curiosidades.
Vi hoje pela janela do carro em que estava algo curioso. Duas casas enfeitadas com cores diferentes e que representavam gostos também diferentes. Uma ao lado da outra, enfeitadas na mesma proporção. Cá com meus botões, pensei: como deve ser a relação entre esses vizinhos?Confesso que queira ter visto as duas famílias em frente das casas conversando e sorrindo. Para a minha história seria excelente. Um exemplo de civilidade! Mas fiquei só no pensamento. No caminho, percebi situações idênticas. Em outro momento, vi de relance um carro com duas bandeiras: uma amarela e outra vermelha e o conselho "Vote Limpo". A identificação sobre qual seria o candidato daquele motorista ficou impossível. Até onde isso demonstrava modelo de pacificidade ou ironia, não sei.
A paixão do campinense (habitante) se estende também ao município. Não conheço outro local onde os moradores sentem tanto prazer em morar. A Justiça Eleitoral prevê para as 20h de hoje a divulgação do resutado final deste segundo turno. Será que toda essa paixão dedicada durante o período eleitoral será retribuída com trabalho sério, humano, honesto pelo vencedor do pleito? Com a palavra, os quatro anos que virão...

sábado, 25 de outubro de 2008

No ônibus

Não é a primeira vez que vejo aquela criança de cabelos queimados do sol, roupa simples - na maioria das vezes sujas -, um pequeno limpador de pára-brisas na mão. Calculo que ele tenha uns quinze, dezesseis anos, não mais que isso. As bases deste cálculo são a fisionomia e o tom da conversa.

Ele sempre chega quando o ônibus da linha 910 estaciona em frente ao ponto no qual espero para ir ao trabalho na TV Paraíba, em Campina Grande. Jamais o vi pagar para ter acesso ao interior do coletivo. Os motoristas permitem a sua entrada por medo de que possam ser vítimas de alguma maldade do garoto. Ele entra e fala com todo mundo, com uma simpatia natural e um dom invejável para a comunicação. Pede moedas, às vezes com a desculpa de que precisa comprar material de trabalho. Aparenta ser um daqueles moleques que ficam parados no sinal à espera de um motorista que queira deixar limpo o pára-brisas do carro. Estranhas, as pessoas retiram do bolso moedas de pequeno valor e as entrega ao garoto. "É melhor eles pedirem do que nos roubar", justifica um senhor de idade que está sentado à minha frente. De longe, ele fita o garoto. "Parece que ele não é drogado. Deve cheirar lá a sua cola...", avalia.
Pouco tempo depois, este mesmo senhor mudaria um pouco a opinião que tinha acerca do menino. Ele vira que o garoto ao descer do ônibus deixava transparecer duas facas presas à cintura. "Olha mesmo! Eu elogiando o danado e ele com duas facas...", bradou. Outro senhor que estava ao meu lado suspirou: "Tá vendo só? É por isso que costumo sempre dar uma moedinha. A gente nunca sabe o que eles podem fazer se não dermos nada."
Por um instante cheguei a refletir sobre essa atitude da sociedade em aceitar que as pessoas sejam obrigadas a dar dinheiro sob o risco de sofrerem algum atentado contra a integridade física. Mas logo, assim como o senhor da frente, mudei a opinião. Duas cenas das quais aquele moleque era ator me chamaram mais atenção do que as facas que portava.
A primeira foi ver que do mesmo local que conversava com uma menina de uns três anos, ele tirou do bolso um boneco que dizia ter comprado para o irmão mais novo. Era um pequeno homem-aranha de borracha que ele fez questão de mostrar como se fixava em qualquer superfície. Correu para o final do ônibus e colou o boneco que começou a descer aos poucos na superfície. As pessoas dentro do ônibus olhavam com interesse a demonstração. A outra foi a prestatividade com que ajudou uma senhora de idade que estava carregada de bolsas pesadas. Chamando de "vó", ele desceu do ônibus com as sacolas e as entregou à "avó" enquanto todos - inclusive eu - ficávamos olhando à espera que ele fugisse com os pertences da senhora.
Não posso pensar que aquele menino seja apenas um bandido após ter presenciado uma atitude tão peculiar a uma criança. O que conheço dele são somente as impressões daqueles quinze minutos no ônibus. Quem sabe dos sonhos daquele moleque? Recuso-me a taxá-lo do que quer que seja. Não tenho esse direito e nem o quero ter. Aprendo muito observando, inclusive que não posso estereotipar as pessoas pela superficialidade.